segunda-feira, fevereiro 27, 2006

Saudade

Saudade são lágrimas que expressam certeza límpida de existência de amor. Saudade não deve entristecer, mas sim fazer viver a parte de coração que se encontra adormecida.

Saudade não deixa esquecer, não deixa adormecer, nem falecer. Saudade é elo de ligação a mundo de todos que preenchem os cantinhos do nosso coração.

Saudade, palavra única portuguesa que exprime toda a franqueza do nosso povo. Sinto saudade sem sentir vergonha de a expressar. Haverá sentimento mais verdadeiro do que a saudade?
Até breve!

quinta-feira, fevereiro 23, 2006

Como esquecer? - Parte IV

Podemos arranjar as maneiras que quisermos de odiar quem amamos, de nos vingarmos delas, de nos pormos a milhas, de lhe pormos os cornos, de lhe compormos redondilhas, mas tudo isso não tem mal. Nem faz bem nenhum. Tudo isso conta como lembrança, tudo isso conta como uma saudade contrariada, enraivecida, embaraçada por ter sido apanhada na via pública, como um bicho preto e feio, um parasita do coração, uma peste inexterminável barata esperneante: uma saudade de pernas para o ar.

O que é preciso é igualar a intensidade do amor a quem se ama e a quem se perdeu. Para esquecer é preciso dar algo em troca. Os grandes esquecimentos saem sempre caros. É preciso dar tempo, dar dor, dar com a cabeça na parede, dar sangue, dar um pedacinho de carne…

E mesmo assim, mesmo magoado, mesmo sofrendo, mesmo conseguindo guardar na alma o que os braços já não conseguem agarrar, mesmo esperando, mesmo aguentando como um homem, mesmo passando os dias vestida de preto, aos soluços, dobrada sobre a areia da Nazaré, mesmo com muita paciência e muito má vontade, mesmo assim é possível que não se consiga esquecer nem um bocadinho.

Quanto mais fácil amar e lembrar alguém – uma mãe, um filho, um grande amor – mais fácil deixar de amá-lo e esquecê-lo.

Raios de sorte, ó lindeza, miséria suprema do amor. Pode esquecer-se quem nos vem à lembrança, aqueles que nos lembramos de vez em quando, com dor ou alegria, tanto faz, com tempo e paciência, aqueles que amámos com paciência, aqueles que amámos sinceramente, que partiram, que nos deixaram, vazios de mãos e cheios de saudades, esses doem-se e depois esquecem-se mais ou menos bem. E quando alguém está sempre presente?

Quando é tarde. Quando já não se aguenta mais. Quando já é tarde para voltar atrás, percebe-se que há esquecimentos tão caros que nunca se podem pagar.

Como é que se pode esquecer o que só se consegue lembrar? Aí está o sofrimento maior de todos. O luto verdadeiro. Aí está a maior das felicidades.
Fim
Miguel Esteves Cardoso

quarta-feira, fevereiro 22, 2006

Como esquecer? - Parte III

Uma saudade cuida-se. Nos casos mais tristes separa-se da pessoa que a causou. Continuar com ela, ou apenas vê-la pode desfazer e destruir a beleza do sentimento, as pessoas que se amam, mas não se dão bem, só conseguem amar-se bem quando não se dão. Mas como esquecer? Como deixar acabar aquela dor? É preciso paciência. É preciso sofrer. É preciso aguentar.
Há grandeza no sofrimento. Sofrer é respeitar o tamanho que teve um amor. No meio do remoinho de erros que nos revolve as entranhas da raiva, do ressentimento, do rancor – temos de encontrar a raiz daquela paixão, a razão original daquele amor.

As pessoas morrem, magoam-se, separam-se, fazem os maiores disparates com a maior das facilidades. Para esquecê-las é preciso chorá-las primeiro. Esta é uma verdade tão antiga que espanta reparar em como ainda temos esperança de contorná-la. Nos uivos das mulheres nas praias da Nazaré não há “histeria” nem “ignorância” nem “fingimento”. Há a verdade que nós, os modernos, os tranquilizados, os cools, os cobardes, os armados em livres e independentes, os tanto-me-fazes, os anestesiados temos medo de enfrentar.

Para esquecer uma pessoa não há vias rápidas, não há suplentes, não há calmantes, ilhas das Caraíbas, livros de poesia – só há lembrança, dor e lentidão com uns breves intervalos pelo meio para retomar fôlego. Esta dor tem de ser aguentada e bem sofrida com paciência e fortaleza. Ir a correr para debaixo das saias de quem for é uma reacção natural, mas não serve de nada e faz pouco de nós próprios. A mágoa é um estado natural. Tem o seu tempo e o seu estilo. Tem até uma estranheza beleza. Nós somos feitos para aguentar com ela.
(continua)
Miguel Esteves Cardoso

terça-feira, fevereiro 21, 2006

Como esquecer? - Parte II

Porque é que é sempre nos momentos em que estamos mais cansados ou mais felizes que sentimos mais a falta das pessoas de quem amamos? O cansaço faz-nos precisar delas. Quando estamos assim, mais ninguém consegue tomar conta de nós. O cansaço é uma coisa que só o amor compreende. A minha mãe. O meu amor. E a felicidade faz-nos sentir pena e culpa de não a podermos partilhar. É por estarmos de uma forma ou de outra sozinhos que a saudade é maior.

Mas o mais difícil de aceitar é que há lembranças e amores que necessitam do afastamento para poderem continuar. Afonso Lopes Vieira dizia que Portugal estava mal, que era preciso exilar-se para poder continuar a amar a Pátria dele. Deixar de vê-la para ter vontade de a ver. Às vezes a presença do objecto amado provoca a interrupção do amor. E a complicação, o curto-circuito, o entaralamento, a contradição que está ali presente, ali, na cara do coração, impedindo-o de continuar.

As pessoas nunca deveriam morrer, nem deixarem de se amar, nem separar-se, nem esquecer-se, mas morrem e deixam-se e separam-se e esquecem-se. Custa aceitar que os mais velhos, que nos deram a vida, tenham de dar a vida para poderem continuar vivos dentro de nós. Mas é preciso aceitar. É preciso aceitar. É preciso sofrer, dar urros, murros na mesa, não perceber. E aceitar. Se as pessoas amadas fossem imortais perderíamos o coração. Perderíamos a religiosidade, a paciência, a humanidade até.
Há uma presença interior, uma continuação em nós de quem desapareceu, que se ressente do confronto com a presença exterior. É por isso que nunca se deve voltar a um sítio onde se tenha sido feliz. Todas as cidades se tornam realmente feias, fisicamente piores, à medida que se enraízam e alindam na memória que guardamos delas no coração. Regressar é fazer mal ao que se guardou.
(continua)
Miguel Esteves Cardoso

segunda-feira, fevereiro 20, 2006

Como esquecer? - Parte I

Como é que se esquece alguém que se ama? Como é que se esquece alguém que nos faz falta e que nos custa mais lembrar que viver? Quando alguém se vai embora de repente, como é que se faz para ficar? Quando alguém morre, quando alguém se separa, como é que se faz quando a pessoa de quem se precisa já não está lá?

As pessoas têm de morrer, os amores de acabar. As pessoas têm de partir, os sítios têm de ficar longe uns dos outros, os tempos têm de mudar. Sim, mas como se faz? Como se esquece?

Devagar. É preciso esquecer devagar. Se uma pessoa tenta esquecer-se de repente, a outra pode ficar-lhe para sempre. Podem pôr-se processos e acções de despejo a quem se tem no coração, fazer os maiores escarcéus, entrar nas maiores peixeiradas, mas não se podem despejar de repente. Elas não saem de lá. Estúpidas!

É preciso aguentar. Já ninguém está para isso, mas é preciso aguentar. A primeira parte de qualquer cura é aceitar-se que se está doente. É preciso paciência. O pior é que vivemos tempos imediatos em que já ninguém aguenta nada. Ninguém aguenta a dor. Dor de cabeça ou de coração. Ninguém aguenta estar triste. Ninguém aguenta estar sozinho. Tomam-se conselhos e comprimidos. Procuram-se escapes e alternativas. Mas a tristeza só há-de passar entristecendo-se. Não se pode esquecer alguém antes de terminar de lembrá-lo. Quem procura evitar o luto, prolonga-o no tempo e desonra-o na alma. A saudade é uma dor que pode passar depois de devidamente doída, devidamente honrada. É uma dor que é preciso primeiro aceitar.

É preciso aceitar esta mágoa, esta moinha, que nos despedaça o coração e que nos mói mesmo, que nos dá cabo do juízo. É preciso aceitar o amor e a morte, a separação e a tristeza, a falta de lógica, a falta de justiça, a falta de solução. Quantos problemas do mundo seriam menos pesados, se tivessem apenas o peso que têm em si: isto é, se os livrássemos da carga que lhes damos, aceitando que não têm solução. Não adianta fugir com o rabo à seringa. Muitas vezes nem há seringa. Nem injecção. Nem remédio. Nem conhecimento certo da doença de que se padeceu. Muitas vezes só existe a agulha.

Dizem-nos para esquecer, para ocupar a cabeça, para trabalhar mais, para distrair a vista, para nos divertirmos mais, mas quanto mais conseguirmos fugir, mais temos mais tarde de enfrentar. Fica tudo à nossa espera. Acumula-se-nos tudo na alma, fica tudo desarrumado.

O esquecimento não tem arte. Os momentos de esquecimento, conseguidos com grande custo, com comprimidos e amigos e livros e copos, pagam-se depois em condoídas lembranças a cobrar. Para esquecer é preciso deixar correr o coração, de lembrança em lembrança, na esperança de ele se cansar.
(continua)
Miguel Esteves Cardoso

domingo, fevereiro 19, 2006

Felicidade absorvente

A felicidade absorve-nos, assim como a tristeza. Felicidade flutuante por entre nuvens decoradas por cores de arco-íris. Flutuo que nem pássaro e desço a pique, sentindo adrenalina atravessando meu espírito. Sou ave que deseja tocar estrelas que em céu límpido cintilam lá longe em noite escura como breu. Alumiam meu caminho à procura de felicidade interior. Feliz sou mesmo em dias de tristeza e fraqueza. Sei ser pássaro e voar para longe de perigos iminentes, procurando quem me tranquiliza.
Até breve!

sábado, fevereiro 18, 2006

Existe uma guerrilha dentro de cada um de nós

“O foco guerrilheiro existe sempre. Em cada um de nós
existe um foco. Uma guerrilha possível
uma insubmissão
Nem é preciso procurar além a serra
o lugar propício
inacessível
A serra está em nós. Começa
em certas noites no nosso próprio quarto
irrompe subitamente sobre a mesa de trabalho
pode aparecer à esquina
em plena rua.

Não é metáfora nem fuga nem miragem
mas uma íntima relação de cada um
com os ciclos da vida
a terra
o próprio ar. Mais do que
estratégia e táctica
é talvez uma questão de ritmo
Ou talvez de energia e relação mágica
do mistério que somos
com o mistério que é tudo”…

Manuel Alegre, “Che”, 1997

sexta-feira, fevereiro 17, 2006

Hoje é dia de festa - a honra de uma amizade!

Existem pessoas que são tatuadas no coração para todo o sempre.

Pessoas de pura amizade, ausente de interesse associado… Gente que nos acompanha em choradeiras, bebedeiras e maluqueiras… Amigos matam vazio solitário, puxando-nos para vida de mil cores…

São assim os amigos simples de verdade! Porto seguro em tempos de tempestade.

quarta-feira, fevereiro 15, 2006


Nada se perde, tudo se transforma

Nada se perde, tudo se transforma e a alma permanece imutável. Verdadeiro ser que eu sou. A alma adormecida não se lembra do que fui. Esquecido o que foi permanecendo imutável. Coisas sentidas vindas das estrelas lá tão longe de mim, do meu corpo molecular sem sequência pós-vida.

Sinto que minhas palavras escritas são alma viva que contraria minha consciência. Algo se apoderou, alma profunda que anseia demonstrar o que sente. Sente paz antes de corpo se decompor. Inexistência de sofrimento, desejo de liberdade.

Sua a ânsia de te libertares para que existas para além do que vês. Vejo para além da linha ténue do horizonte onde barco navega em ondas de harmonia. O equilíbrio presente na minha mente que adormece meu vazio e minha dor.

Harmonia afasta perigos que te querem destruir minha alma. Nasceste em cativeiro, mas teu corpo não te quer mal. Medeia a tua ligação com o presente e delineia teu futuro
.

terça-feira, fevereiro 14, 2006

E ao quarto Dia da Criação fez-se luz

Foi ao Quarto Dia que Deus distinguiu a noite do dia. Assim será Porto de Natura… Umas vezes radiante como o sol, outras vezes triste como a noite, embora não considere que a noite seja triste!

Hoje apetece-me falar de cores de alma ou de alma incolor…

Existem momentos de aperto incompreensível que me deixam irrequieta interiormente; meus pés permanecem imóveis, enquanto minha mente viaja para além do infinito, pairando lá longe no intermédio cinzento, a caminho de buraco negro.

Existem momentos em que sinto que vazio é igual a cinzento claro e ausência igual a cinzento escuro… e preto? Preto é mistério de alma que navega. Negro é mais escuro que preto. Preto me acalma, negro sobressalta… cinzento é pesado de nuvem que teima em não se tornar gota. Minha alma se sente incolor, inodora e sem sabor… que cor vestir, que perfume usar em dias que passam sempre iguais? Cansada estou de vestir cinzento. Preferia preto, vermelho, amarelo-torrado e branco igual a luta pela harmonia… amanhã azul, verde e lilás igual a sorriso de alegria…
Até breve!

segunda-feira, fevereiro 13, 2006

Quem sou eu? - perguntam vocês e eu também!

Segundo informações bíblicas, foi no Terceiro Dia da Criação que Deus ordenou às águas que se juntassem num só lugar para que o chão aparecesse seco. A partir daí, Deus chamou ao chão seco "terra" e ao conjunto das águas "mar". Reza a lenda que nesse mesmo dia "a terra produziu relva, ervas que produzem semente, cada uma segundo a sua espécie, e árvores que dão fruto com a semente, cada uma segundo a sua espécie".

Esta questão da criação de sementes e das árvores que dão fruto sempre me fez muita confusão. Desde muito nova que a minha mãe me contou que eu era fruto duma semente. Ainda me lembro do primeiro dia em que ela me expôs a essa dura realidade, quando lhe perguntei: “oh mãe, como é que eu nasci?”, ao que ela respondeu “tu nasceste duma sementinha que o pai pôs num pequeno ovo da mãe”.

Podem crer que eu, pobre criança de 3 ou 4 anos, entrei em estado de choque! Como é que meu pai conseguia produzir sementes para por num ovo? E de onde é que elas saíam?!?!?!? Eu pensava que as únicas sementes existentes à face da terra eram aquelas que o meu pai deitava em chão seco a que Deus chamou “terra”, que depois de regadas se transformavam progressivamente em batatas, abóboras ou nabos! Mas que raio, então a que espécie eu pertenceria? Seria anabada, aboborada ou abatadada? E o ovo? Onde seria o lugar do ovo no meio disto tudo? Pensava eu que os ovos eram somente produção de galinha, pardal, andorinha, melro ou cegonha! E os ovos estrelados de que tanto eu gostava? Estaria eu a comer os meus queridos irmãozinhos?

Eu nem queria acreditar na crueldade deste mundo tão confuso para mim, pobre criança de tenra idade. E foi a partir desse lindo dia que entrei numa primeira e única crise existencial, que perdura há vinte e tal anos!

Pois então, não me perguntem quem eu sou, porque só sei que não sei quem sou…

Até breve!

domingo, fevereiro 12, 2006

O meu primeiro blog - há uma primeira vez para tudo!

Este é o meu primeiro blog, e como tal, uma fase experimental nesta área.

Espero agradar a gregos, a troianos e aos demais cidadãos deste belo país à beira mar plantado. Não o trocaria por nenhuma outra nação, mesmo que soubesse que poderia auferir o dobro do salário que actualmente ocupa 25% do espaço dos meus bolsos...

Lutarei pela minha liberdade de expressão, bem como pela de quem quiser participar, seja para rir, chorar, magoar, gritar ou acarinhar!

Espero que a censura jamais invada este Porto de Natura, caso contrário serei obrigada a informar que a dita cuja do Salazar já lá vai... E eu nem sequer a conheci!

Para festejar a abertura deste belo espaço, deixo uma fotografia da mais bela cidade do mundo: a Invicta do meu coração!

Até breve!

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