terça-feira, junho 17, 2008

Por entre sumo de amora cor de sangue, os gatos assustam-se!

Adormeceste em meus braços secos de vida. Desejei abraçar-te, contudo, perdi todos os meus cinco sentidos. Libertaste-me do teu ódio, e agora esvaio-me nos três litros e meio de sangue, que me alaga o cabelo, outrora castanho e ondulado. Não sinto a sua temperatura. Não distingo a cor daquele líquido e a sua textura também me é indiferente. Percorre-me uma linha pelo rosto, como se fosse uma lágrima a humedecer-me os lábios, que adoptam a cor vermelho baço. Já não sinto qualquer emoção. É mera coincidência esta alusão a uma lágrima que não sinto.

Morro pela primeira vez e, como tal, não sei reencarnar o teu corpo. És homem e eu fui mulher. Agora que sou espírito devo desabituar-me de todos os costumes femininos. Não domino o teu corpo, mas reino em teus sonhos. Quis que recordasses aquele dia em que me viste a correr desvairada e alegre atrás de um gato. Sempre me atraiu a sua independência e a capacidade de treparem árvores, muros e percorrerem telhados. Gostava de os ver ultrapassar obstáculos. Sentia-me feliz por eles e corria, esforçando-me por aprender o impulso que deveria dar aos meus quatro membros para, num ápice, trepar a uma amoreira. Lembras-te que adorávamos amoras de árvore? Esmagávamo-las entre os dedos, o sumo que escorria pelos braços era o nosso sangue, enquanto fingíamos estar feridos. Divertíamo-nos a lamber aquele líquido doce que nos manchava os braços e a cara.

Distraída, nesse dia, ria e corria atrás de um gato. Assustaste-me quando gritaste:
- Pára! Não é assim que se faz. O gato não tem culpa que estejas zangada! – disseste.
- Zangada, eu? Estou apenas a aprender como se trepa uma árvore. Os gatos fazem-no melhor que ninguém – respondi, quase sem fôlego.
- Não tens o direito de os assustar, para aprender o que nunca irás conseguir.
- Quem os assusta és tu, a gritares dessa forma estúpida!
- Não estou a gritar e prefiro aprender a percorrer telhados.
- Telhados? Bô! Catano! O garoto não está bom da cabeça. Pr´a quê isso?
- Para ver se as estrelas caiem. Gostava de ter uma na gaiola que fiz para o meu grilo.
- Eu prefiro amoras. São o nosso sangue.
- És parva! Aquilo não é sangue! É sumo de amora.
- Eu sei! Vê-se mesmo que nunca brincaste aos feridos, com sumo de amora.
- E achas que são os gatos que te vão ensinar a chegar ao alto da amoreira?
- Talvez! Hoje não consegui, porque o assustaste com os teus berros. Devem ter-se ouvido até ao outro lado da aldeia. Os gatos acham-nos capazes de atirar pedrras, quando nos enfurecemos.
- Eu não peguei em pedras!
- Pois não. Mas eles sabem que o podemos fazer quando nos enfurecemos. E o mais grave é que as podemos atirar e magoá-los. Não entendes que precisam de tempo para confiarem nos humanos?
- Para confiarem em nós? Como é que isso se faz?
- Tens que deixar que o gato te veja várias vezes. Podes levar-lhe umas espinhas ou leite, para mostrares que gostas dele e para que ele comece a gostar de ti. Percebes?
- Não sei se percebo. Só depois de tentar. Deve ser complicado para um animal aprender a confiar em alguém que não fala como eles.
- Olha, eu prefiro vê-los ao longe. Um dia quero ter vida de gato.
- Oh! Sabes lá o que dizes!

Desapareceste, distraído, pensando na estratégia a adoptar para conquistar a confiança daqueles seres independentes, que não compreendias.
(Fase experimental de um conto, que está a ficar uma grande merda... Continua...)
Ana Teresa Pinto Lousada

5 Comments:

Blogger Blad3 said...

Em 1º não está nd a ficar 1 grande merda! estou a adorar acredita! =)
E quero que continues! :D
Penso que na parte final... penso que descreves o que 1 ser humano precisa noutro... confiança n é algo que se ganha da noite para o dia!
Mt bom mesmo continua! =)

Ah! 1 aparte se mo permites!

"- Para ver se as estrelas caiem. Gostava de ter uma na gaiola que fiz para o meu grilo."

Não deveria ser cairem? :) só 1 aparte!

Bjos

19 junho, 2008 01:59  
Blogger Natura said...

Olá Blade. :)

"Para ver se as estrelas caírem"? Penso que não.

Esse tempo verbal ficaria bem, se a frase fosse: "para ver as estrelas caírem".

De qualquer modo, esta parte precisa ser mais trabalhada. Tenho noção disso. Aceito todas as sugestões e mais algumas.

Obrigada pela atenção e comentários. :)

19 junho, 2008 19:35  
Blogger CLAP!CLAP!CLAP! said...

http://www.youtube.com/watch?v=NoooscPFiyc

Beijito

21 junho, 2008 12:44  
Blogger CLAP!CLAP!CLAP! said...

alguém que um dia te percebeu, se preocupou contigo e q tenta nao perder a mão. Conheces o texto do O´Neil sobre a amizade?

21 junho, 2008 15:58  
Blogger CLAP!CLAP!CLAP! said...

Há aqui muitas imagens poderosas à solta!..e se continuasses?

21 junho, 2008 16:31  

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